AMBIENTALISTAS CRITICAN A PETROBRAS

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Ambientalistas criticam a Petrobras por fazer, no Equador, coisa que as leis brasileiras a impedem de fazer por aqui: explorar petróleo em Parques Nacionais
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Manoel Francisco Brito

O presidente Luis Inácio Lula da Silva desembarca na quarta-feira, 25 de agosto, em Quito para uma visita oficial ao Equador e é bem provável que no seu comitê de recepção, além das autoridades locais, estejam organizações não-governamentais de defesa do meio ambiente e entidades ligadas à tribos indígenas. Pretendem fazer um protesto contra a Petrobras, que se prepara para iniciar a exploração de petróleo em uma concessão que fica no coração do Parque Nacional de Yasuni, na amazônia equatoriana. Acusam a empresa de ter padrão duplo de comportamento, ao decidir fazer no Equador coisa que no Brasil ela está impedida por lei: retirar petróleo em Parques Nacionais.

Para a empresa começar a trabalhar na extração dentro do Parque, só falta a licença ambiental do Ministério do Ambiente do Equador. Tudo indica que ela vai sair. «O ministério é cheio de boas intenções, mas seu poder é pequeno. Há muita pressão para que a licença seja dada», suspira Elizabeth Bravo, da Ong Oilwatch. Por essa razão, os ambientalistas decidiram colocar pressão diretamente sobre a empresa e sensibilizá-la para desisitir de retirar petróleo do solo do Yasuni.

Como tudo indica que não vai adiantar, os ambientalistas equatorianos preparam-se também para celebrar a chegada do presidente brasileiro à Quito dando entrada com um pedido de liminar na Justiça para impedir que a licença ambiental definitiva seja concedida à Petrobras. A empresa, através de sua assessoria de imprensa, mostrou-se solícita em discutir o assunto. Mas até a véspera da visita do presidente brasileiro ao Equador, não tinha designado ninguém para conversar com a reportagem de O Eco.

O Yasuni foi declarado Parque Nacional pelo governo do Equador em 1979. Ele fica na província de Orellana, no nordeste do país, e se espalha por uma extensão de quase 680 mil hectares de área protegida, localizada entre os rios Napo e Curaray, afluentes do Amazonas. Sua vegetação, heterogênea, é classificada como floresta úmida tropical. No interior do Parque – que tem o maior número de espécies vegetais por hectare em todo o mundo – já foram identificadas mais de 500 espécies de aves e quase 200 de mamíferos. Por conta desta diversidade, o Yasuni foi elevado pela Unesco, em 1989, à condição de Reserva da Biosfera.

O título não impediu que, em nome do desenvolvimento economico, áreas no entorno e dentro do Parque continuassem a ser licitadas para a exploração de petróleo por empresas privadas (ver mapa). Desde 1984 já havia petroleiras em atividade na região. «A coisa piorou muito depois de 1990, quando a legislação ambiental foi ‘flexibilizada’ para permitir a prospecção em áreas de preservação permanente», conta Alexandra Almeida, da Ong equatoriana Accion Ecológica, uma das mais ativas na defesa do que ainda sobra de área preservada no Yasuni.

A área concedida à Petrobras para a exploração, embora não possa mais ser qualificada como intocada – desde 1997 ela passou por prospecções para determinar a qualidade e a quantidade de petróleo que existe debaixo do solo – ainda está bastante preservada. Jeffer Castelo Branco, que dirige entidade de defesa de trabalhadores afetados pela poluição química em Santos, esteve no Yasuni no início de agosto, numa missão internacional de ambientalistas que foi verificar os efeitos da extração de petróleo no Parque.

Não chegou a entrar na concessão que pertence à Petrobras, conhecida como Bloco 31, por conta da dificuldade de acesso. Ele a viu apenas pelas bordas. «É uma floresta madura, belíssima», diz. A Petrobras recebeu a área em 2001. Ela veio junto com a Perez Companc, empresa de energia comprada em 2002 pela estatal brasileira. Foi a Perez quem ganhou a concessão para explorar o Bloco 31. Noventa por cento dele se encontra nos limites do Parque. As prospecções no local começaram em 1997. Com base nos dados coletados, dois poços, Apaika e Nenke, foram perfurados. A Petrobras realizou novas prospecções sísmicas através de sua subsidiária equatoriana, a Petrobras Energy Ecuador, e tem a intenção de perfurar mais 12 poços no local.

Para explorar o Bloco 31, a Petrobras, além dos poços, planeja construir uma Central de Processamento, alojamentos para 120 trabalhadores durante os trabalhos de perfuração, 32 km de oleoduto e uma estrada com 29 km de extensão. São números que deixam os ambientalistas arrepiados. As Ongs criticam os planos da empresa, não apenas porque eles deixam clara sua intenção de explorar sua concessão no interior do Parque, mas porque acredita que eles não contemplam adequadamente as necessidades de conservação da região. Criticam também a falta de planos detalhados de contigência para enfrentar eventuais acidentes.

Justiça seja feita, até a Petrobras reconhece que o Yasuni é uma jóia ecológica. O estudo de impacto ambiental encomendado pela Petrobras à consultoria Walsh sobre seus planos de operação no Parque pode não atender às preocupações dos ambientalistas. Mas reitera a importância da diversidade biológica na região do Parque. A empresa também não se negou a debater suas intenções em relação ao Bloco 31. Mas elegeu um interlocutor privilegiado, o Grupo de Assessoria Técnica do Yasuni (GAT), que reúne cientistas das principais universidades equatorianas e técnicos do Ministério do Ambiente que participam da gestão do Parque. Desde dezembro do ano passado, tiveram 4 reuniões.

Os ambientalistas dizem que os encontros entre as duas partes não foram suficientemente transparentes e que, apesar das inúmeras recomendações feitas pelo pessoal do GAT à empresa, seus pontos de vista é que acabaram prevalecendo. A Petrobras chegou a entabular um diálogo com os ambientalistas. «Mas foi tímido», lamenta Bravo, da Oilwatch. No dia 28 de maio, sua Ouvidoria enviou carta aos participantes da campanha pela preservação do Yasuni reiterando que nos sete anos de prospecção realizados, primeiro pela Perez Companc e depois pela Petrobras, no Bloco 31, não há notícia de conflito sócio-ambiental e tampouco de desrepeito às leis do Equador.

A carta lembra também que a Petrobras tem know-how no manejo de projetos em plena selva amazônica no Brasil e que todo o processo que levou à sua decisão de explorar o Bloco 31 dentro do Yasuni foi acompanhado por técnicos ambientais do Ministério de Energia e Minas do Equador. Especificamente, a carta discute apenas um dos pontos que preocupam os ambientalistas: a estrada de 29 km que a empresa pretende abrir. Ela diz que a estrada é a melhor opção economica e ambiental e jura que sua construção planeja levar em conta as necessidades da fauna local.

Ela será estreitada em alguns de seus pontos para criar «pontes de copa», onde as partes superiores da vegetação à margem da estrada se tocariam para permitir o tráfego de espécies entre um lado e outro da estrada. Os ambientalistas argumentam que as «pontes de copa» ainda são experimentais e que sua validade como instrumento de preservação ainda está longe de ser comprovada. Rebatem também a afirmação da empresa de que o projeto foi elogiado pelo International Finance Corporation (IFC), entidade ligada ao Banco Mundial. Dizem que o elogio tem tom condicional e que, de todo o modo, para se adequar as regras do IFC sobre investimentos ecologicamente corretos, seria necessário aprofundar os estudos de impacto ambiental.

Castello Branco, um dos dois brasileiros que participou da missão internacional que foi investigar a operação de empresas petrolíferas na região do Yasuni, reitera que mesmo que a Petrobras tome todas as providências ambientais possíveis, a exploração de petróleo, em qualquer região, sempre tem alto impacto ambiental. «É da sua natureza», afirma. «Se mesmo em áreas urbanas ela já produz efeitos nocivos, imagine o que acontecerá dentro do Parque».

Pode ser até que os planos da Petrobras para o Yasuni produzam um tipo de exploração de petróleo mais limpa. Mas os precedentes na região do Parque não são lá muito animadores. A Petrobras é uma das últimas petroleiras a chegar a até ela. Outras estão lá há mais tempo. Duas delas, a candense Encana e a espanhola Repsol, que iniciaram suas explorações por lá há mais de uma década, já deixaram cicatrizes tanto no ecossistema do Parque como nas populações indígenas que habitam a área.

Juliana Malerba, da Rede de Justiça Ambiental e outra brasileira que esteve na missão ao Yasuni, diz que a estrada de 180 quilômetros – construída aliás pela Andrade Gutierrez – que permitiu o início das explorações de petróleo na região tem todos os ingredientes de degradação que acompanham a chegada de atividades econômicas industriais à áreas de preservação. Ela é margeada por dutos de petróleo e fêz nascer cidades que, há 12 anos, não existiam. «Não chegam a parecer favelas», conta Castello Branco, «mas é óbvio que suas construções são irregulares. Estão muito próximas da estrada e parecem não ter qualquer tipo de planejamento urbano».

Ele também testemunhou vazamentos. Um deles bem na entrada do Yasuni. E não foi apenas a fauna e a flora que sofreram com as explorações. Elas atingiram em cheio o modo de vida dos Huaorani, a tribo de índios dominante na região. A incidência de doenças antes inexistentes, como a hepatite B, é alta e eles foram proibidos de caçar. «Dependem completamente dessas empresas», lamenta Castello Branco, «inclusive para comer».

Alexandra Almeida, da Accion Ecologica, gostaria muito que a Petrobras levasse em conta tudo isso e também o fato de que ela, no Brasil, estaria impedida de fazer esta exploração. «O Bloco 31, que pertence à empresa, tem uma biodiversidade impressionante e ela está sob o risco de, aos poucos, desaparecer», lamenta.

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